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sábado, 9 de novembro de 2013

Operação Átrio: Pagamentos recorrentes

Investigadores encontraram indícios de corrupção na autorização de ao menos seis empreendimentos comerciais e residenciais. Convocado a depor, Paulo Octávio interrompeu viagem a São Paulo e negou participação no esquema. 

Carro da Polícia Civil em frente à Administração Regional de Águas Claras: investigação chegou à conclusão de que propina era recorrente
 
A investigação que resultou na Operação Átrio teve início em 2011. Na época, o foco era a construção de apenas um empreendimento, o Centro Clínico de Taguatinga. Durante o processo, o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e a Polícia Civil do DF encontraram indícios de pagamentos recorrentes de propina para servidores das administrações de Águas Claras e de Taguatinga.

Pelo menos seis prédios comerciais e residenciais foram erguidos sem respeitar o trâmite legal, apontam as investigações. Segundo consta no inquérito, além do Centro Clínico da cidade, os responsáveis pelas construções do JK Shopping & Tower, do Vinícius Condomínio Resort, do Residencial Península, do Le Boulevard e do Kimberley Plain — os dois últimos pertencentes ao empresário Luiz Bezerra de Oliveira — não respeitaram as etapas para a obtenção do alvará.

A lista também cita o Residencial Alírio Neto, embora fique no Guará. São projetos milionários em cidades em pleno desenvolvimento. Somente a obra do JK Shopping & Tower teve investimentos da ordem de R$ 450 milhões, segundo  Paulo Octávio. Do total, conta o empresário, R$ 350 milhões teriam sido investidos por ele e pelo restante pelos lojistas. O empreendimento ainda não tem habite-se. A licença para funcionamento estava prevista para o dia da inauguração.

O empresário e ex-vice-governador falou à imprensa no escritório de seu advogado. Ele se disse inocente e alegou desconhecer o motivo da investigação. “A Paulo Octávio está tranquila e vai continuar trabalhando. Não pagamos nada para aprovação de projetos. Pagamos, sim, para os escritórios contratados — e são os melhores do Brasil. Cabe a esses escritórios esclarecer essa questão de aprovação de projetos”, diz.

Ele também ressaltou ter se apresentado voluntariamente à delegacia. No entanto, foi obrigado a depor por meio de um mandado de condução coercitiva, instrumento jurídico usado para obrigar suspeitos a prestarem depoimento no dia e horário determinados pela Justiça. “Trata-se de uma estratégia para evitar que os suspeitos combinem os depoimentos”, explicou o diretor-geral da Polícia Civil do DF, Jorge Xavier.

Paulo Octávio se explica: Nenhum empreendimento em área irregular
 
Shopping JK , ainda sem habite-se: inauguração prevista para o dia 16


Depoimento

Paulo Octávio passou uma hora e meia prestando esclarecimentos na Deco. Embora argumente ter falado na condição de testemunha, o MPDFT não tem dúvidas da participação dele no suposto esquema. Os promotores pediram a prisão dele, que foi negada pela Justiça.

O empresário defendeu a lisura nos processos de todas as suas construções. “Nenhum dos nossos empreendimentos está fora da lei, nenhum foi condenado, nenhum foi construído em área irregular. Tenho minha consciência totalmente limpa. Não vou julgar porque fui convidado a dar meu depoimento, mas farei quantas vezes for necessário”, disse. Ele afirmou ainda não ter sido questionado pelo delegado sobre pagamento de propinas a funcionários públicos. Teria apenas detalhado os procedimentos para a construção de uma obra.

O ex-vice-governador explicou ainda que a empresa tem 51 projetos em processo de aprovação no DF. Desses, dois são em Taguatinga e um, em Águas Claras. O empresário reclamou da lentidão para a liberação de alvarás. “Temos projetos há três anos tramitando. É um fato que merece esclarecimento por parte do governo. Recentemente, foi criada uma força-tarefa para tentar agilizar, mas, até então, os resultados não foram os melhores possíveis”, apontou. Na opinião dele, a burocracia não justifica as acusações. “Jamais cederíamos (às propinas) ”, garantiu.

Paulo Octávio descartou a ligação das investigações com a proximidade das eleições. “A política é uma constante guerra entre partidos, entre ideologias. Em Brasília, todos conhecem meu trabalho político. Sei que tenho adversários. Mas, neste caso, não entendo que tenha essa conotação”, disse. “Mas exatamente neste momento em que eu voltei à vida pública, essa investigação teve início”, completou.

O ex-senador não esconde o desejo de voltar a um cargo público em 2014. O político renunciou ao cargo de vice-governador em 2010, depois do escândalo deflagrado com a Operação Caixa de Pandora.

Paulo Octávio está entre os denunciados de participação no suposto esquema, mas também nega envolvimento. “Não há provas que me relacionem a essas denúncias”, disse.

R$ 50 mil

Quantia encontrada na casa de Carlos Sidney, ex-administrador de Águas Claras Operação de dois nomes

Intitulada de Operação Átrio pelo Ministério Público do DF e dos Territórios (MPDFT), as investigações receberam, da Polícia Civil, o nome de Hamurabi. Os investigados, quando submetidos à fiscalização dos órgãos de controle, alegavam o desconhecimento da lei. Por outro lado, a polícia afirma que os acusados se colocavam acima da Justiça para fazerem valer interesses privados.

A escolha do nome é, então, uma referência ao rei babilônico que, por volta de 1.700 a.C, compilou a legislação pré-existente, gravando-a em blocos para que ninguém mais alegasse falta de conhecimento. 

Perfis

Dinheiro em casa


O advogado Carlos Sidney Oliveira, 70 anos, assumiu a Administração de Águas Claras 45 dias depois de um escândalo no órgão. Um dos fundadores do PMDB no Distrito Federal, ele chegou ao cargo por indicação do deputado distrital Olair Francisco (PTdoB), mesmo padrinho político do antecessor, Manoel Carneiro, que se envolveu em denúncias envolvendo a impressão de 250 mil gibis, sem licitação, no valor de R$ 992 mil. Natural de Piritiba (BA), trabalhou na Secretaria de Serviços Sociais, na década de 1970, e atuou na Campanha de Erradicação de Invasões (CEI), na criação da cidade de Ceilândia. Ele foi preso na manhã de ontem em casa, na Quadra 107 de Águas Claras. Na residência do administrador, policiais civis e promotores de Justiça encontraram R$ 50 mil em dinheiro. 

Conexões políticas e religiosas

 

Indicado para a Administração de Taguatinga pelo deputado distrital Washington Mesquita (PTB), o empresário Carlos Alberto Jales, 46 anos, tem muitas conexões políticas. Foi chefe da Unidade de Administração Geral da Secretaria de Esportes na gestão do ex-deputado Aguinaldo de Jesus (PR) e assessor da Casa Civil no governo de Rogério Rosso, em 2010. Ex-chefe de gabinete de Mesquita, ele tem planos de concorrer a um mandato de distrital em dobradinha com o aliado, potencial candidato à Câmara dos Deputados.

Católico, tem entre os padrinhos políticos o Padre Moacir Anastácio, na Paróquia São Pedro, de Taguatinga. Por dois anos consecutivos, foi coordenador da Semana de Pentecostes. Atuou como empresário do ramo de automóveis. A mulher dele, Marfisa Jales, funcionária do Senado, está entre os investigados.

Suspeitos exonerados

Mara Puljiz

Os administradores de Taguatinga e de Águas Claras, além de outros três servidores, sendo dois comissionados detidos durante a Operação Átrio, serão investigados em procedimento disciplinar instaurado ontem pela Secretaria de Transparência e Controle do Distrito Federal. A decisão consta no Decreto nº 34.802, assinado pelo governador em exercício, Tadeu Filippelli (PMDB), e publicado no Diário Oficial do DF, em edição extra. A pasta tem ainda 65 dias para a realização de uma auditoria a fim de verificar as concessões de alvarás pelas administrações regionais da capital federal.

Ao fim da apuração, uma comissão de auditores fará um relatório e o encaminhará ao governador Agnelo Queiroz com as recomendações de mudanças a respeito das práticas administrativas. O secretário de Transparência do DF, Mauro Noleto, destacou que os servidores investigados podem ainda perder as funções no governo local. “Se apurarmos a participação dessas pessoas em fatos graves, a exoneração pode ser convertida em destituição do cargo. Isso implicará que elas não sejam nomeadas a qualquer cargo no Governo do Distrito Federal durante algum tempo”, explicou Noleto. 

Inspeções 

O secretário acrescentou que o governo local não sabia das irregularidades atribuídas a tais servidores. “A Secretaria de Transparência tem cumprido rigorosamente a sua missão institucional e realiza periodicamente diversas inspeções na capital do país e em todas as RAs (regiões administrativas), mas esse fato específico não era de conhecimento prévio”, garantiu Noleto.

Fonte: Saulo Araújo, Kelly Almeida e Ana Pompeu - Correio Braziliense

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