Investigadores
encontraram indícios de corrupção na autorização de ao menos seis
empreendimentos comerciais e residenciais. Convocado a depor, Paulo
Octávio interrompeu viagem a São Paulo e negou participação no esquema.
Carro da Polícia Civil em frente à
Administração Regional de Águas Claras: investigação chegou à conclusão
de que propina era recorrente |
A investigação que resultou na Operação Átrio teve início em 2011. Na
época, o foco era a construção de apenas um empreendimento, o Centro
Clínico de Taguatinga. Durante o processo, o Ministério Público do DF e
Territórios (MPDFT) e a Polícia Civil do DF encontraram indícios de
pagamentos recorrentes de propina para servidores das administrações de
Águas Claras e de Taguatinga.
Pelo menos seis prédios comerciais e residenciais foram erguidos sem
respeitar o trâmite legal, apontam as investigações. Segundo consta no
inquérito, além do Centro Clínico da cidade, os responsáveis pelas
construções do JK Shopping & Tower, do Vinícius Condomínio Resort,
do Residencial Península, do Le Boulevard e do Kimberley Plain — os dois
últimos pertencentes ao empresário Luiz Bezerra de Oliveira — não
respeitaram as etapas para a obtenção do alvará.
A lista também cita o Residencial Alírio Neto, embora fique no Guará.
São projetos milionários em cidades em pleno desenvolvimento. Somente a
obra do JK Shopping & Tower teve investimentos da ordem de R$ 450
milhões, segundo Paulo Octávio. Do total, conta o empresário, R$ 350
milhões teriam sido investidos por ele e pelo restante pelos lojistas. O
empreendimento ainda não tem habite-se. A licença para funcionamento
estava prevista para o dia da inauguração.
O empresário e ex-vice-governador falou à imprensa no escritório de seu
advogado. Ele se disse inocente e alegou desconhecer o motivo da
investigação. “A Paulo Octávio está tranquila e vai continuar
trabalhando. Não pagamos nada para aprovação de projetos. Pagamos, sim,
para os escritórios contratados — e são os melhores do Brasil. Cabe a
esses escritórios esclarecer essa questão de aprovação de projetos”,
diz.
Ele também ressaltou ter se apresentado voluntariamente à delegacia. No
entanto, foi obrigado a depor por meio de um mandado de condução
coercitiva, instrumento jurídico usado para obrigar suspeitos a
prestarem depoimento no dia e horário determinados pela Justiça.
“Trata-se de uma estratégia para evitar que os suspeitos combinem os
depoimentos”, explicou o diretor-geral da Polícia Civil do DF, Jorge
Xavier.
Paulo Octávio se explica: Nenhum empreendimento em área irregular |
Shopping JK , ainda sem habite-se: inauguração prevista para o dia 16 |
Depoimento
Paulo Octávio passou uma hora e meia prestando esclarecimentos na Deco. Embora argumente ter falado na condição de testemunha, o MPDFT não tem dúvidas da participação dele no suposto esquema. Os promotores pediram a prisão dele, que foi negada pela Justiça.
O empresário defendeu a lisura nos processos de todas as suas
construções. “Nenhum dos nossos empreendimentos está fora da lei, nenhum
foi condenado, nenhum foi construído em área irregular. Tenho minha
consciência totalmente limpa. Não vou julgar porque fui convidado a dar
meu depoimento, mas farei quantas vezes for necessário”, disse. Ele
afirmou ainda não ter sido questionado pelo delegado sobre pagamento de
propinas a funcionários públicos. Teria apenas detalhado os
procedimentos para a construção de uma obra.
O ex-vice-governador explicou ainda que a empresa tem 51 projetos em
processo de aprovação no DF. Desses, dois são em Taguatinga e um, em
Águas Claras. O empresário reclamou da lentidão para a liberação de
alvarás. “Temos projetos há três anos tramitando. É um fato que merece
esclarecimento por parte do governo. Recentemente, foi criada uma
força-tarefa para tentar agilizar, mas, até então, os resultados não
foram os melhores possíveis”, apontou. Na opinião dele, a burocracia não
justifica as acusações. “Jamais cederíamos (às propinas) ”, garantiu.
Paulo Octávio descartou a ligação das investigações com a proximidade
das eleições. “A política é uma constante guerra entre partidos, entre
ideologias. Em Brasília, todos conhecem meu trabalho político. Sei que
tenho adversários. Mas, neste caso, não entendo que tenha essa
conotação”, disse. “Mas exatamente neste momento em que eu voltei à vida
pública, essa investigação teve início”, completou.
O ex-senador não esconde o desejo de voltar a um cargo público em 2014.
O político renunciou ao cargo de vice-governador em 2010, depois do
escândalo deflagrado com a Operação Caixa de Pandora.
Paulo Octávio está entre os denunciados de participação no suposto
esquema, mas também nega envolvimento. “Não há provas que me relacionem a
essas denúncias”, disse.
R$ 50 mil
Quantia encontrada na casa de Carlos Sidney, ex-administrador de Águas Claras Operação de dois nomes
Intitulada de Operação Átrio pelo Ministério Público do DF e dos
Territórios (MPDFT), as investigações receberam, da Polícia Civil, o
nome de Hamurabi. Os investigados, quando submetidos à fiscalização dos
órgãos de controle, alegavam o desconhecimento da lei. Por outro lado, a
polícia afirma que os acusados se colocavam acima da Justiça para
fazerem valer interesses privados.
A escolha do nome é, então, uma referência ao rei babilônico que, por
volta de 1.700 a.C, compilou a legislação pré-existente, gravando-a em
blocos para que ninguém mais alegasse falta de conhecimento.
Perfis
Dinheiro em casa
O advogado Carlos Sidney Oliveira, 70 anos, assumiu a Administração de Águas Claras 45 dias depois de um escândalo no órgão. Um dos fundadores do PMDB no Distrito Federal, ele chegou ao cargo por indicação do deputado distrital Olair Francisco (PTdoB), mesmo padrinho político do antecessor, Manoel Carneiro, que se envolveu em denúncias envolvendo a impressão de 250 mil gibis, sem licitação, no valor de R$ 992 mil. Natural de Piritiba (BA), trabalhou na Secretaria de Serviços Sociais, na década de 1970, e atuou na Campanha de Erradicação de Invasões (CEI), na criação da cidade de Ceilândia. Ele foi preso na manhã de ontem em casa, na Quadra 107 de Águas Claras. Na residência do administrador, policiais civis e promotores de Justiça encontraram R$ 50 mil em dinheiro.
Conexões políticas e religiosas
Indicado para a Administração de Taguatinga pelo deputado distrital Washington Mesquita (PTB), o empresário Carlos Alberto Jales, 46 anos, tem muitas conexões políticas. Foi chefe da Unidade de Administração Geral da Secretaria de Esportes na gestão do ex-deputado Aguinaldo de Jesus (PR) e assessor da Casa Civil no governo de Rogério Rosso, em 2010. Ex-chefe de gabinete de Mesquita, ele tem planos de concorrer a um mandato de distrital em dobradinha com o aliado, potencial candidato à Câmara dos Deputados.
Católico, tem entre os padrinhos políticos o Padre
Moacir Anastácio, na Paróquia São Pedro, de Taguatinga. Por dois anos
consecutivos, foi coordenador da Semana de Pentecostes. Atuou como
empresário do ramo de automóveis. A mulher dele, Marfisa Jales,
funcionária do Senado, está entre os investigados.
Suspeitos exonerados
Mara Puljiz
Os administradores de Taguatinga e de Águas Claras, além de outros três
servidores, sendo dois comissionados detidos durante a Operação Átrio,
serão investigados em procedimento disciplinar instaurado ontem pela
Secretaria de Transparência e Controle do Distrito Federal. A decisão
consta no Decreto nº 34.802, assinado pelo governador em exercício,
Tadeu Filippelli (PMDB), e publicado no Diário Oficial do DF, em edição
extra. A pasta tem ainda 65 dias para a realização de uma auditoria a
fim de verificar as concessões de alvarás pelas administrações regionais
da capital federal.
Ao fim da apuração, uma comissão de auditores fará um relatório e o
encaminhará ao governador Agnelo Queiroz com as recomendações de
mudanças a respeito das práticas administrativas. O secretário de
Transparência do DF, Mauro Noleto, destacou que os servidores
investigados podem ainda perder as funções no governo local. “Se
apurarmos a participação dessas pessoas em fatos graves, a exoneração
pode ser convertida em destituição do cargo. Isso implicará que elas não
sejam nomeadas a qualquer cargo no Governo do Distrito Federal durante
algum tempo”, explicou Noleto.
Inspeções
O secretário acrescentou que o governo local não sabia das
irregularidades atribuídas a tais servidores. “A Secretaria de
Transparência tem cumprido rigorosamente a sua missão institucional e
realiza periodicamente diversas inspeções na capital do país e em todas
as RAs (regiões administrativas), mas esse fato específico não era de
conhecimento prévio”, garantiu Noleto.
Fonte: Saulo Araújo, Kelly Almeida e Ana Pompeu - Correio Braziliense
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