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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Decisões às escuras: Caso Raad Massouh - voto aberto é incógnita

Apesar de a Lei Orgânica prever que a sessão para análise de processo por quebra de decoro não seja secreta, o parlamentar pode entrar com recurso na Justiça e conseguir o sigilo na votação em plenário. Em 2010, Eurides obteve decisão semelhante 

Raad Massouh (E) durante depoimentos na Comissão de Ética da Câmara Legislativa: defesa do deputado ainda não decidiu se entrará com recurso contra votação aberta

Depois de cassar dois parlamentares por voto secreto, a Câmara Legislativa deve decidir, pela primeira vez em sua história, o destino de um distrital em sessão aberta. O processo contra o deputado Raad Massouh (PPL) será avaliado no plenário por seus 23 colegas, provavelmente em outubro. Desde 2006, a Lei Orgânica do Distrito Federal prevê o voto aberto em processos de cassação (Leia O que diz a lei). Mas um precedente ainda mantém dúvidas em torno do caso.

Há três anos, a então deputada Eurides Brito recorreu à Justiça e conseguiu garantir o direito ao voto secreto. A história pode se repetir, já que advogados de Raad ainda discutem com o deputado se haverá recursos contra a sessão aberta. Como a Constituição Federal prevê o voto secreto por maioria absoluta e no Congresso Nacional essa ainda é a forma de analisar processos de cassação, juristas reconhecem que o assunto é controverso.

Em junho, em entrevista ao Correio, Raad afirmou que não recorreria aos tribunais para brigar pela votação secreta. “Acho importante ver como cada um vai votar”, disse à época. No entanto, o advogado do parlamentar, Rodrigo Nazário, ressaltou ontem que o assunto não está resolvido. “Ainda vamos analisar isso. Por enquanto, nossa preocupação é para que haja uma isonomia com relação aos outros deputados”, afirmou o advogado. Ele se refere à decisão da Mesa Diretora que arquivou representações contra os deputados Rôney Nemer (PMDB) e Aylton Gomes (PR), com o argumento de que os parlamentares ainda não têm condenação definitiva.

No caso de Raad, a Comissão de Ética aprovou, na quarta-feira, um relatório do deputado Joe Valle (PSB), favorável à cassação. Agora, o processo está nas mãos do plenário, que poderá debater o caso após cinco consecutivas sessões da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o que deve jogar a decisão para outubro. O deputado do PPL é acusado de envolvimento no desvio de recursos de uma emenda parlamentar de R$ 100 mil, liberada para um evento rural de Sobradinho no fim de 2010. 

Constituição 

A controvérsia sobre o voto aberto começou há três anos, na análise do processo contra Eurides Brito. A nova redação da Lei Orgânica, que assegura as votações sem sigilo, já estava em vigor. Mas advogados da parlamentar recorreram à Justiça sob a alegação de que o dispositivo contrariava a Constituição Federal. O Tribunal de Justiça acatou os argumentos, e a sessão foi secreta — o que não ajudou a distrital a salvar seu mandato, já que Eurides foi cassada por 16 votos. O primeiro distrital cassado na história da Câmara Legislativa foi Carlos Xavier, acusado de ordenar o assassinato de um adolescente identificado como o suposto amante de sua ex-mulher. Em 2004, a lei não previa o voto aberto para análise de quebra de decoro.

O advogado Arnaldo Versiani, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), reconhece que o tema é controverso, mas defende a autonomia da Câmara para deliberar sobre as regras de votação. “Acredito que cada assembleia legislativa tem autonomia para definir a forma de votação, de acordo com suas conveniências”, explica.

Já o especialista em direito constitucional Mamede Said, professor da Universidade de Brasília, ressalta que a Lei Orgânica não pode se sobrepor à Constituição Federal. “As regras sobre o processo legislativo e a organização dos poderes são de reprodução obrigatória nos estados e municípios. É preciso seguir o que a Constituição estabelece para deputados federais e senadores, que é a votação secreta e por maioria absoluta em casos de cassação”, afirma o constitucionalista.

Autor da emenda à Lei Orgânica que criou a obrigatoriedade da votação aberta na Câmara Legislativa, o deputado Chico Leite (PT) lamenta a polêmica. “Compreendo que é constitucional e me recuso a votar secretamente. Entendo que, se o deputado for à Justiça pedir a votação secreta, estará confessando a culpa”, afirma. 

Em análise 

Em junho, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a eliminação do voto secreto em todas as votações do Congresso. Esta semana, a Câmara dos Deputados criou um grupo para deliberar sobre o tema. Quando a Constituição for alterada, não haverá mais controvérsia sobre o voto aberto na Câmara Legislativa. 

O que diz a lei 

O Artigo 56 da Lei Orgânica do Distrito Federal determina que todas “as deliberações da Câmara Legislativa e de suas comissões serão tomadas por maioria de votos, presente a maioria absoluta de seus membros, em votação ostensiva (aberta)”. Esse dispositivo está em vigor desde 2006, quando foi aprovada a Emenda à Lei Orgânica nº 47, de autoria do deputado Chico Leite (PT).

A Lei Orgânica abre uma única exceção. A legislação estabelece que, “quando o sigilo for imprescindível ao interesse público, devidamente justificado, a votação poderá ser realizada por escrutínio secreto, desde que requerida por partido político com representação na Câmara Legislativa e aprovada, em votação ostensiva, pela maioria absoluta dos deputados distritais”. 


Conversa gravada 

As gravações feitas na casa de Raad Massouh, em Sobradinho, entre 8 e 12 de agosto, foram entregues à Polícia Civil. O pastor foi identificado pelo deputado como sendo Eliseu dos Santos, da Igreja de Deus no Brasil da cidade. Mas a PCDF não confirma a identidade dele. Confira alguns trechos abaixo: 

(...) Pastor: Estou estarrecido. O que aconteceu? Depois que o menino foi procurado lá, ele quer saber quem é que era a favor quem é que era contra e foi procurar saber. O que acontece? Você já está perdendo de 3 a 1. O Agaciel pulou fora. (…) O Rôney disse que vai te pegar mesmo, que está acertado. O que aconteceu? Então juntou o Agaciel, o Rôney e e o Michel. Só tem ao seu favor o Olair. E aí o que que eles falaram, os três: segura aí pra você ter o parecer. Dois e Setecentos. 

Raad: Como é? 

Pastor: Dois e Setecentos. Para dividir entre os três. 

Raad: Aí eu não consigo fazer. Não consigo nem os mil e trezentos. Eu mesmo não vou fazer porque não é da minha índole. 

Pastor: Quando saí de lá eu disse: eu acho que não vai rolar. Eu vou levar a minha proposta e vocês resolvam’. O valor está assim para dividir entre o Michel, o Rôney e o Agaciel. O Michel disse lá na hora: ‘se ele quiser, ele paga para ver. A gente fez isso para extorquir e ponto final. Disse: para extorquir. Não é perseguição é para extorquir mesmo.’ 

(...) Raad: Mas esse pessoal que tem esse contato com certeza não deve ser o Rôney. Deve ter com os que participaram com ele. Não será o Joe Valle, não? Porque o Rôney não está nessa comissão. 

Pastor: É o Joe. Não é o Rôney, eu troquei o nome.
 
Por Helena Mader
 
Polícia investiga tentativa de extorsão 
    
Jorge Xavier quer parceria com o MP para apurar denúncia


A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) quer trocar informações com o Ministério Público a respeito das investigações sobre a suposta tentativa de extorsão ao distrital Raad Massouh (PPL). Alvo de um processo de cassação por quebra de decoro na Câmara, o parlamentar denunciou à corporação ter sido procurado por um pastor de Sobradinho II, que teria se passado como representante de três deputados que compõem a Comissão de Ética. De acordo com o interlocutor, os deputados queriam R$ 2,7 milhões para arquivar a representação contra Raad.

Um dos citados pelo pastor, Dr. Michel (PEN), que preside a Comissão de Ética, também foi à polícia ontem. “Não tenho nada a ver com isso. Fui citado e quero que a pessoa que diz falar em meu nome seja identificada e presa”, ressaltou. Raad entregou quatro áudios , somando mais de uma hora de gravação (leia trechos ao lado), ao diretor-geral da Polícia Civil do DF, Jorge Xavier, mesmo procedimento adotado no último dia 13, quando entregou a denúncia à procuradora-geral de Justiça do DF, Eunice Carvalhido.

Segundo o distrital, o fato de ter divulgado a tentativa de extorsão justamente no dia da apresentação do relatório que pediu sua cassação foi coincidência. “Eu procurei porque o procedimento no MP corre sob sigilo e temi pela minha segurança e de minha família”, explicou.

Raad teria sido procurado várias vezes por um pastor da Igreja de Deus em Sobradinho II, identificado por ele como Eliseu dos Santos — a Polícia Civil não confirma esse nome. Nas gravações, feitas na casa do distrital, em Sobradinho, eles conversam sobre uma negociação para arquivar o processo. As gravações citam Dr. Michel, Joe Vale (PSB), relator do caso Raad na comissão, Agaciel Maia (PTC), membro do colegiado, e Olair Francisco (PTdoB). O também distrital Rôney Nemer (PMDB) teve o nome ventilado pelo pastor, mas depois ele reconhece que o confundiu com Joe Valle. 

Troca de informações 

Jorge Xavier disse ontem que ainda esta semana vai tentar se encontrar com Eunice Carvalhido. “Vamos fazer isso até para não bater cabeça. Precisamos caminhar no mesmo sentido. Acredito que podemos identificar de fato a pessoa que fala com o deputado na gravação para averiguar o que houve”, ressaltou. O diretor da Polícia Civil disse que ainda não pode falar oficialmente que se trata do pastor Eliseu. “É fato a ser checado”, ponderou.

Na semana passada, Dr. Michel disse, durante uma sessão do caso na comissão, que uma pessoa o teria procurado no gabinete com insinuações sobre se aceitaria dinheiro para arquivar o caso. “Mas não aceitei nem conversar”, afirmou. Ontem, ele se encontrou com Jorge Xavier. Estava acompanhado do colega Chico Vigilante (PT). “Eu quero que isso seja verificado, já que meu nome está em jogo. Falar, até papagaio fala, mas quero ver é provar. Se esse pastor for mesmo identificado dizendo coisas em meu nome na gravação, vou entrar com uma representação contra ele”, garantiu Michel.

Fonte: Correio Braziliense

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