Publicado em 2 de Março de 2012 por Marc Arnoldi
A arca está pronta para ser lançada às águas, que já começam turvas
Munido de dois certificados fornecidos “a pedido” pela Anvisa e enquanto o STJ não dá notícias do inquérito 3333, o governador Agnelo Queiroz, após a “arrumação da casa” e o saneamento da “herança maldita” - descritos insistentemente pelo Palácio do Buriti como obras principais do primeiro ano da sua administração -, entra no que se considera o ano mais importante do seu mandato.
Com uma Lei Orçamentária Anual elaborada da primeira à última linha por sua equipe (não que a de 2011 tenha sido tão diferente, porque a equipe de transição teve liberdade para reorganizar a proposta orçamentária) e com um amontoado de secretários relativamente ajustado a não menos ampla aliança política que o levou ao Palácio do Buriti, Agnelo tem que mostrar, muito além das vinhetas de TV, que o Novo Caminho tem trilha diferente, balizada e viável.
Há muita gente de olho no governador, e não apenas o eleitor. O que se observa é que, diante de novas dificuldades que deixam vir à tona uma delicada situação administrativa e fiscal do GDF, o mundo político se movimenta.
A campanha 2010 foi uma frustração tanto para os políticos, quanto para os eleitores. O efeito Caixa de Pandora varreu o palco da consulta eleitoral. Fez ruir planos de longa data, afugentou nomes históricos e deixou à luz dos holofotes composições político-partidárias inconcebíveis poucos meses antes. A Ficha Limpa e a substituição matrimonial fecharam com chave de ouro dos tolos uma campanha que ficará como a pior, em termos qualitativos, da jovem história democrática de Brasília.
É verdade que o baixo nível do pleito passado não afeta a legitimidade da eleição de Agnelo, mas está na base do atual e tão precoce preenchimento da lista dos candidatos à sua sucessão. Só nesta semana, um deputado federal e um suplente de deputado distrital compareceram à mídia para inscrever-se na lista já bem guarnecida de pretendentes ao Buriti.
Até agora, e respeitando as matizes das declarações (há os que se posicionaram abertamente candidatos, aqueles que “colocaram o nome à disposição”, outros ainda “estimam reunir as condições para...”), a lista se apresenta mais ou menos com esse desenho: Agnelo Queiroz na cabeça. Embora não tenha se declarado, é candidato natural à reeleição, porque o próprio PT veta prévias para os titulares de cargos majoritários. Não bastasse isso, existe a lógica também na política.
Agnelo, como todo governante já posto, tem a seu favor a máquina que ajuda, a caneta que assina e o orçamento que contempla. Pode-se dizer que, de todos os candidatos, é o único que só depende dele para repetir a dose. Contando com uma maioria ampla na Câmara e um Governo Federal correligionário, suas condições de trabalho são mais confortáveis que as de Cristovam que tinha, quando governador de 1995 a 1998, a aliança PSDB/PFL na Praça dos Três Poderes e Esplanada dos Ministérios, e Luiz Estevão no fim da Asa Norte. Ele se beneficiou, no primeiro ano, de uma certa benevolência de uma sociedade ainda desorientada pela Caixa de Pandora, mas 2012 será um ano chave.
Cristovam e Rollemberg têm um futuro assegurado até 2018 no Senado Federal. Não conseguiram acertar-se em 2010 a fim de compor a tradicional terceira via, e sentem hoje que talvez a sorte passou selada naquele 3 de outubro. A situação do senador do PDT se complicou com o julgamento do CD-Rom. A não ser que o STJ, em seu recurso, reverta a posição do TJDFT, o apóstolo da Educação verá seu registro de candidatura ser questionado pelos adversários na disputa onde tudo vale.
Rodrigo Rollemberg é um dos nomes de peso do PSB, partido que tenta trilhar seu caminho próprio na engarrafada centro-esquerda brasileira. Ele conta com o vizinho goiano e o projeto de Júnior da Friboi para realizar uma dobradinha eleitoral em 2014 capaz de fixar definitivamente uma âncora pessebista no Centro-Oeste.
Alberto Fraga, sem mandato, num partido em severa crise tanto nacional quanto local, mantém seu estilo lendário nas redes sociais, o bate-pronto. Transita com desenvoltura do centro à direita, tem luz própria, mas precisa aumentar sua família.
Izalci Lucas tem problemas de partido. É bom lembrar que sua chegada diretamente à direção do PR-DF se deu em outros tempos, na época do Arruda-todo-poderoso. Manteve o Partido da República fora da grande aliança Novo Caminho, permitiu a eleição de dois federais (Ronaldo Fonseca e ele), fato inédito para a agremiação de Waldemar Neto no DF, mas não conseguiu evitar a irresistível atração que todo Governo faz na Câmara Legislativa. Perdendo o controle aqui, ele não teve mais sorte com a direção nacional. E procura hoje uma saída jurídica que não lhe faça perder o mandato por infidelidade partidária.
O anúncio da candidatura de Raimundo Ribeiro, pouco divulgado, parece se tratar de uma tomada de posição de parte do PSDB-DF. Após a ventilação de dois nomes paranaenses para aportar em terras candangas, a declaração de Izalci deixou pulga atrás de certas orelhas. Nada melhor que marcar território para dificultar a chegada de novo cacique amanhã.
Eliana Pedrosa fecha a lista provisória dos que já se declararam dispostos à briga majoritária. De casa nova no PSD que será testado nas urnas pela primeira vez em 2014 (mas que terá nas prefeituras do Entorno um excelente terreno de ensaio), ela pratica um mandato distrital que pode ser chamado de “oposição pragmática”, não deixando de votar a favor de projetos do GDF que lhe parecem satisfatórios. Sua marca registrada são as incontáveis reuniões DF afora. Dos nomeados, é a única que pode pretender alcançar uma parcela significativa do eleitorado que ficou “à deriva”, já que Joaquim Roriz não será mais candidato.
Para quem deseja melhor lustrar um quadro sucessório, vale recordar números das eleições de 2010:
Nome Votos Candidatos
Agnelo 1º turno 676.394 5
Toninho 1º turno 199.095 5
Cristovam Senador (*) 833.480 16
Rollemberg Senador (*) 738.575 16
Fraga Senador (*) 511.517 16
Izalci Federal 97.914 109
Eliana Distrital 35.387 820
Ribeiro Distrital 12.794 820
(*) A eleição para Senador em 2010 teve duas vagas, e por isso duas possibilidades de votos para o eleitor.
Nesta verdadeira arca que virou o barco batizado de “Sucessão”, e antes mesmo de desbravar o mar eleitoral, o eleitor aqui identificado por Noé, terá até dificuldade em cumprir a Palavra transcrita em Gênesis.
- De todos os animais limpos levarás contigo sete e sete, o macho e sua fêmea; mas dos animais que não são limpos, dois, o macho e sua fêmea.
Pode ser um mero simbolismo. Mas que a arca não aceitará gente suja, isso é certo.
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