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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

'NÃO TEM NADA DE MAIS - A SÉRIE', POR CARLOS ALBERTO SARDENBERG (1ª parte)

PUBLICADO NO GLOBO DESTA QUINTA-FEIRA
 
Governador Agnelo dos Santos Queiroz Filho (PT-DF)
 
A nossa série “Não tem nada de mais” recebeu várias contribuições. A melhor, disparado, veio de Brasília.

Nesse conjunto de chantagens e contra-chantagens em curso na política local, há pelo menos um fato admitido por todos os envolvidos. Em 25 de janeiro de 2008, o atual governador Agnelo Queiroz, então diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, recebeu em sua conta corrente um depósito de R$ 5 mil, feito por Daniel Almeida Tavares, funcionário do laboratório farmacêutico União Química. Nesse mesmíssimo dia, Agnelo liberou um certificado da agência reguladora considerando o laboratório companhia idônea, apta a produzir e participar de licitações públicas.

Qual o problema? – tratou de responder o hoje governador. Não tem nada de mais, explicou, apenas uma enorme coincidência. Contou: o Daniel, amigo antigo, ficou numa pior e estava sem dinheiro para pagar umas contas. Agnelo, então, emprestou 5 mil reais. Para facilitar e evitar a trabalheira do amigo de ir ao banco descontar um cheque ou sacar a grana, Agnelo entregou logo os 5 mil em dinheiro vivo, um pacote de notas. Credor e devedor não julgaram necessário assinar qualquer documento. Ficou na confiança.

Segue a história relatada pelos dois personagens: passou o tempo, Daniel melhorou de vida e, já empregado no laboratório, lembrou-se de pagar ao amigo justo em um dia em que não estava em Brasília. Assim, não podendo levar o dinheiro vivo lá no escritório da Anvisa, fez um depósito na conta de Agnelo. Daniel nem sabia que o certificado beneficiando sua empresa estava na mesa de Agnelo, nem este sabia que o depósito seria feito naquele 25 de janeiro.

Uma enorme coincidência, dessas coisas que acontecem, não é mesmo? E ninguém saberia disso se Daniel não tivesse guardado o recibo de depósito por esses quase três anos e se esse papel não tivesse “vazado” para políticos e imprensa. Mas se o negócio era todo na base da confiança, por que ele teria guardado o recibo esse tempo todo? E como o teria deixado escapar, numa situação que obviamente prejudicaria o hoje governador e antigo amigo?

Questões sem importância, insinuam os envolvidos. O que admitem é o seguinte: o governador pegou do bolso 5 mil reais em dinheiro vivo, emprestou e recebeu de volta via depósito bancário. O resto é coincidência da vida e armação dos inimigos e da imprensa.

Admitamos que tenha sido assim mesmo. Não fica esquisito que o diretor da agência reguladora mantenha uma relação, digamos, de credor/devedor com o funcionário de uma empresa regulada pelo primeiro? Será que o diretor da agência não deveria sentir-se impedido de assinar um documento favorecendo o serviço do amigo/devedor/funcionário do laboratório beneficiado?

Que Daniel, o amigo, tenha contado duas histórias, uma denunciando Agnelo, outra o defendendo, também é normal? Não tem nada de mais?

Agnelo Queiroz é o quarto governador de Brasília envolvido em denúncias de corrupção. Nenhum dos outros três foi julgado em caráter definitivo.

Não tem nada de mais.
 
Por Carlos Alberto Sardenberg

Fonte: Veja.com - Coluna Augusto Nunes
Blog do Edson Sombra

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