O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, quebrou o silêncio
após o julgamento do mensalão e afirmou, nesta quarta-feira, que vai
pedir a apuração das denúncias feitas pelo empresário Marcos Valério
envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no esquema de
desvio de dinheiro público condenado pelo Supremo Tribunal Federal
(STF). Gurgel adiantou que episódios relacionados a Lula serão
encaminhadas à primeira instância.
"Vamos ver o que existe no depoimento que possa motivar futuras
investigações. Como sempre, nada deixará de ser investigado. Quanto
especificamente ao presidente Lula, uma eventual investigação já não
compete ao procurador-geral da República, já que o ex-presidente já não
detém prerrogativa de foro. Então, se estiver algo relacionado ao
ex-presidente, isso será encaminhado à Procuradoria da República de
primeiro grau", explicou Gurgel.
De acordo com o procurador, Marcos Valério teria entregado poucos
documentos que comprovariam seu depoimento, feito em setembro. Entre
eles, estariam dois comprovantes de depósito. Gurgel não detalhou os
valores nem os beneficiários dos depósitos, mas acrescentou que
possíveis investigações serão conduzidas pelo Ministério Público de São
Paulo ou do Distrito Federal.
"Ele entregou alguns documentos, muito poucos, e esses documentos agora
serão avaliados para que se possa tomar as providências necessárias à
apuração. Lembro, por exemplo, de dois comprovantes de depósitos. Isso
tem que ser avaliado, quem são os beneficiários desses depósitos, em que
contexto isso foi feito. Tudo isso, enfim, tem que ser aprofundado para
que a atuação do Ministério Público seja responsável e com objetivo de
tudo apurar", disse.
Cauteloso, Gurgel acrescentou que as denúncias de Valério, que foi
condenado a mais de 40 anos de prisão no julgamento do mensalão, devem
ser vistas com ressalvas. Para o procurador, o empresário mineiro já se
manifestou anteriormente sem apresentar qualquer prova das declarações
feitas. "Com muita frequência, Marcos Valério faz referência a
declarações que ele considera bombásticas e, quando nós vamos examinar
em profundidade, não é bem isso", afirmou.
O procurador também relativizou a possibilidade de Valério ter a pena
reduzida em função das supostas denúncias. No caso, a delação premiada
não caberia, segundo Gurgel, porque as revelações do empresário não
acrescentaram nada ao que os ministros do Supremo já vinham analisando.
"O interesse de Marcos Valério de colaborar seria mais oportuno se
manifestado antes do julgamento da ação penal 470. Claro que o
Ministério Público está aberto a qualquer momento a ouvi-lo, se tiver
informações realmente valiosas, digamos assim. Porque muitas vezes se
afirma o interesse de colaborar, e as informações que são trazidas ao
Ministério Público já foram inclusive publicadas pela imprensa", disse o
procurador. "Então, evidentemente aí não há sinceridade nesse interesse
de colaboração. Desde o início da ação penal 470, a conduta de Marcos
Valério foi de afirmar esse interesse, mas não concretizar esse
interesse com declarações efetivamente importantes para o Ministério
Público. O Ministério Público não pode ser instrumento de qualquer coisa
que não seja adequada", afirmou Gurgel.
O mensalão do PT
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento
no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal
Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo
ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para
votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe
da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e
perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou
como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e
ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio
Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados
por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por
corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da
República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com
isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três
anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP,
morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do
suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus
sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das
funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles
respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção
ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José
Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados
por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O
publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a
ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro
da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por
peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique
Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de
dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT/SP) responde a processo
por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui
ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio
delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações
finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes.
Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o
irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio
Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira
decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o
ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a
corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o
Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o
defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento
de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa
Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
Fonte: Terra - Por Gustavo Gantois
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